Faz duas ou três semanas eu tive uma vontade insana de ler os poetas místicos do oriente médio. Geralmente, os meus livros favoritos são aqueles que me escolhem como leitora, e não o contrário. Sempre foi assim - livros que eu escolho ler porque tenho curiosidade, ou porque ouvi falar serem bons, dão sorte se são lidos até a metade. Agora, livros que me escolhem (que por um motivo completamente abstrato e irracional me causam um desejo comparável ao de mulher grávida) geralmente parecem ter esperado por mim o tempo todo.
Existe um sabor diferente ao abrir esses livros. É uma experiência quase tão prazeroza como devorar um pote de doce-de-leite caseiro mineiro depois de dois anos morando num país que não conhece doce-de-leite. Se equipara a comer queijo-fresco, ou lambuzar a boca de requeijão. Quando eu leio os livros que me pediram pra lê-los, eu me lambuzo sem ter que pedir desculpas.
Na maioria das vezes, esses livros me trazem sinais, lições que só naquele momento eu estou pronta pra ver, pra ouvir, pra sentir. Normalmente (apesar de não ter nada de muito normal nisso tudo) são livros que se encaixam perfeitamente com o momento que eu estou vivendo.
Outra coisa que passei a reparar é que os livros que me escolhem, aqueles que realmente causam o impacto de um meteoro aterrizando em mim, são livros de poesia ou de não-ficção, de resenhas. Raramente me encontro tão envolvida num livro de ficção, e parece que quanto mais o tempo passa e mais velha eu fico, menos paciência eu tenho pra ficção. Lembro de três que me marcaram nos últimos três anos - só.
E é assim que estou me deliciando no momento com Mowlana Jalaluddin Rumi, Rabindranath Tagore, e Khalil Gibran.
Esses poetas são conhecidos aqui no Canadá como poetas místicos. Os grandes temas de suas poesias são geralmente o mistério do amor, da vida, da morte, e de Deus. A simplicidade e a beleza com que escrevem me faz refletir muito sobre minha própria vida. Aceitar o mistério através da presença do silêncio humilde diante da grandiosidade do poder absoluto é outra lição sempre presente nessa coleção de poesia magestral.
Fica aqui meu posting da semana... Não muito reflexivo, mas com a sincera e humilde vontade de dividir com quem estiver lendo o Porto, algo realmente profundo e de muito mais beleza do que qualquer coisa que eu venha a escrever.
Paz,
Carol
Páginas
Aviso Importante:
(O Porto Feminino é um blog sem fins lucrativos, que existe desde 2007. Todos os textos foram escritos por Carolina Miranda, e são portanto de autoria original. Não existe qualquer vínculo entre o Porto Feminino e o Porto Feminino Shop).
23/05/2010
20/05/2010
Encruzilhadas...
Foi difícil escolher sobre o que escrever essa semana. Fiquei tão pensativa, e pra falar a verdade, até esse último segundo, enquanto o computador abria a página de posting do blog, eu achei que iria escrever sobre amizades, na verdade, em como amizades mudam (e as vezes acabam...) com o tempo.
Mas no fundo, eu percebi que a semana inteira o tópico era um só: encruzilhadas. São esses momentos na vida que a gente sabe que tem tantos caminhos pra escolher, tantas possibilidades, e que escolher um desses caminhos significa deixar pelo menos outros três, e então ou a gente tem fé e coragem, ou não. Pode até ser que as outras trilhas (que foram deixadas pra tras em certo momento) cruzem de novo com o caminho que a gente escolheu seguir, mas a verdade é que não saberemos nunca e só tem um jeito de descobrir o que estar por vir: continuar indo. Continuar andando.
No fundo, eu acho que a gente se depara com encruzilhadas o tempo todo: na vida amorosa, no trabalho, na vida familiar, na vida social...
Na vida amorosa por exemplo, lembro bem do momento em que realmente saquei o que significava estar casada pra mim. Infelizmente, essa revelação no meu caso pelo menos, veio uns três anos depois de eu já estar casada oficialmente... Mas o meu casamento mudou mesmo quando eu percebi que escolher uma pessoa pra se passar o resto da vida, é no fundo, uma aventura muito maior e mais profunda (e mais incerta) do que quando a gente começa um novo relacionamento com uma nova pessoa.
Nos relacionamentos que estão começando a pessoa pode ser novidade, mas a sequência de eventos da relação é completamente repetitiva. Namorei umas tantas pessoas, e quando eu olho pra trás, o começo era sempre o mesmo: excitante, quase obsessivo! Mas o fim eminente também era sempre muito familiar... Quando passei por maus bocados no meu casamento, e quando o barco quase afundou de vez, a gente resolveu tentar de novo. Casamos de novo. Dessa vez, só eu e meu marido, sem festa, só com uma canoa e um casal de castores que estavam fazendo a casinha deles e que serviram de testemunha... Escolhi a trilha longa da encruzilhada... Cansei de rodar em círculos.
Existe algo infinito, incerto, e de certa forma assustador sobre o ato de se passar uma vida inteira do lado de uma pessoa. Mas uma coisa eu digo com certeza (hoje): não existe rotina. Simplesmente porque com dois seres-humanos envelhecendo juntos, tudo pode mudar a qualquer momento. Então casamento é um exercicio constante de renovação, de eterno entendimento. As pessoas mudam. Todo mundo muda. Acho inclusive um pouco ingênuo achar vamos continuar sendo sempre os mesmos.
Amizade é assim também. Todas as minhas amizades mudaram com o tempo. É impossível não mudar - nossa vida muda, toma rumos diferentes, as pessoas crescem, tomam decisões importantes, alteram valores, reavaliam quem são... E com isso algumas amizades se distanciam, outras se aproximam. O difícil é saber como mater as portas abertas pros amigos que estão distantes no momento. Essa é outra encruzilhada.
Ultimamente tenho lidado com isso. Tenho duas amigas aqui por quem tenho muito carinho e respeito, mas que no fundo, fizemos escolhas completamente diferentes e nossa vida não podia estar mais distante. O problema mesmo nem é a distância que nos separa, mas é o quanto uma das minhas amigas se deixou consumir por uma energia negativa, uma auto-piedade que pra ser sincera, testa a minha paciência. Aliás tem uma coisa que hoje pra mim é fundamental em qualquer prospecto de amizade: a capacidade de que o amigo em potencial tem de honrar suas próprias escolhas, de se responsabilizar por suas ecruzilhadas.
Isso não quer dizer que não podemos mudar de idéia no caminho. Claro que sim. Mas ai com certeza, é um momento em que nos vemos diante de outra encruzilhada, é um momento de se reavaliar, e talvez continuar no mesmo caminho, ou seguir outra rota.
Como esse blog tinha por intenção inicial discutir o meu empasse, a minha encruzilhada de querer ou não ter filhos, não tem como eu deixar de fazer aqui um paralelo. Eu acho que ter filhos é uma dessas encruzilhadas que Deus põe na nossa frente. No fim, o importante é escolher um caminho e aceitar a escolha com dignidade - enxergando a beleza que esse caminho tem pra oferecer.
Tem gente que diria que esse papo soa demais com resignação. Eu discordo. Resignação tras em si um aspecto triste, uma idéia de que viver em arrependimento é necessário. Eu discordo profundamente. Eu acho que na fúria de tentar sempre achar algo novo, algo perfeito, algo supremo, nós perdemos duas coisas: a paciência que realmente precisamos pra viver, e a capacidade de nos comprometer, de honrar nossas escolhas a longo prazo.
Enfim... Qualquer que seja sua encruzilhada, eu te desejo paciência e coragem o suficiente pra não olhar apenas pra tras e ficar pensando nos caminhos não cruzados. Que você tenha consiga ver o que está ao seu redor, no caminho escolhido.
Continuemos todos caminhando...
Carol
08/05/2010
Comprometida (Committed)
Mais uma vez, estou me deliciando com o livro mais novo de Elizabeth Gilbert - Committed (ainda sem tradução em português). Dessa vez, a autora de Comer, Rezar, Amar tenta refletir, analizar, entender, e fazer as pazes com a instituição do casamento.
O livro não fez muito sucesso aqui ainda, desde que foi lançado em Março desse ano. Mas se pararmos pra pensar, o tremendo sucesso de vendas de Comer, Rezar, Amar também não foi imediato. Tampouco foi um sucesso de crítica logo em seu início de vida.
Elizabeth Gilbert escreve mais uma vez, com uma vontade voraz de entender as bagunças de seu próprio coração e da sua própria geografia. Ela é despretenciosa e em nenhum momento tenta convencer o leitor de que sua proposta é avaliar a instituição do casamento ao ponto de revolucionar os estudos antropológicos ou sociais a respeito.
A proposta do livro é simples: uma mulher traumatizada por relacionamentos, recebe um cheque-mate na vida quando o amor que ela finalmente escolheu é barrado pelas autoridades americanas de entrar no país, e a única solução que lhes é dada é o casamento. Assim se inicia então mais uma grande busca: achar humildade suficiente pra fazer as pazes com a mesma instituição que quase lhe comeu a alma um livro antes.
Como fez em Comer, Rezar, Amar, Gilbert se propõe a buscar um sentido pro momento em que esta vivendo onde for possível: amigos, parentes, conversas, yoga, e muitos livros sobre a teoria e a história do casamento (soa parecido?).
Committed, é só isso: um livro em que a autora reflete sobre si mesma, seus relacionamentos, durante uma busca incansável por sentidos, numa linguagem simples, e por vezes, hilária! E justamente na sua sinceridade simples, sua linguagem coloquial, e fatos interessantes aprensentados de maneira informal, a gente sente que está re-encontrando uma velha amiga! Retomando a conversa desde a última vez que nos vimos, e dessa vez sobre uma nova etapa na nossa vida.
Eu aposto que assim como seu livro anterior, o sucesso de Committed vai acontecer por recomendações de mulheres que sabem que casamento não é tarefa fácil e que é preciso muito jogo de cintura, bom humor, e reflexão pra se seguir adiante. A escritora é honesta em todas as páginas, e em nenhum momento pinta um casamento cor-de-rosa, mas também não pinta o apocalipse.
Jovens que ainda não são casadas, talvez não se empolguem tanto com essa "sequencia", mas eu garanto que o livro é delicioso (e traz um certo alívio) pra qualquer mulher que se vê debatendo com as questões do casamento - casar ou não casar, eis a questão. Ficar casada, ou não? Eis outra questão.
Uma das críticas que eu li é que "Liz" tenta ser um pouco socióloga, um pouco antropóloga e acaba não sendo nada. Eu discordo. Em nenhum momento, ela se propõe em apresentar uma tese sobre a história ou as implicações sociais do casamento e quem escreveu isso pegou o bonde andando.
Os fatos que ela escolhe dividir com seus leitores são bastante inteligentes, e pertinentes, mas a verdade é que eu nunca vou ler uma tese de doutorado sobre as origens Cristãs do casamento. O que Gilbert faz, é digerir e dividir algumas informações sensíveis sobre a história do casamento como se estivéssmos sentadas pra um bate-papo no Frans Café em São Paulo.
Ela faz isso de tal forma que toda essa conversa escolarizada tem finalmente uma chance de talvez passar a fazer parte das conversas de seus leitores (mulheres de classe média entre 25 e 40 anos, casadas ou contemplantes do casamento e que tem outras coisas pra fazer além de estudar a origem do casamento).
Eu tenho certeza que eu não vou ser a única leitora a me identificar com a autora nessa sua nova empreitada. E aprecio a sua generosidade em querer dividir comigo a sua busca em entender pelo menos um pouco mais (o pouco que nos é necessário na vida do dia-a-dia) o quão complicada é a questão de casamento, e como estamos todas no mesmo barco.
Aliás, pra mim, essa é a melhor parte de Committed. A sensação de que eu não estou sozinha e que minhas angústias e dúvidas da vida casada são divididas com mulheres que nem conheço. Existe um alívio nisso tudo, uma possibilidade de identificação e de um entendimento do qual eu acho que ainda não falamos muito abertamente.
Se você é como eu, "ajuntada" ou casada, jovem, feminista, e não liga pra o que os críticos do New York Times tem a dizer, então é uma livro que eu recomendo!
Boa leitura!
Carol
O livro não fez muito sucesso aqui ainda, desde que foi lançado em Março desse ano. Mas se pararmos pra pensar, o tremendo sucesso de vendas de Comer, Rezar, Amar também não foi imediato. Tampouco foi um sucesso de crítica logo em seu início de vida.
Elizabeth Gilbert escreve mais uma vez, com uma vontade voraz de entender as bagunças de seu próprio coração e da sua própria geografia. Ela é despretenciosa e em nenhum momento tenta convencer o leitor de que sua proposta é avaliar a instituição do casamento ao ponto de revolucionar os estudos antropológicos ou sociais a respeito.
A proposta do livro é simples: uma mulher traumatizada por relacionamentos, recebe um cheque-mate na vida quando o amor que ela finalmente escolheu é barrado pelas autoridades americanas de entrar no país, e a única solução que lhes é dada é o casamento. Assim se inicia então mais uma grande busca: achar humildade suficiente pra fazer as pazes com a mesma instituição que quase lhe comeu a alma um livro antes.
Como fez em Comer, Rezar, Amar, Gilbert se propõe a buscar um sentido pro momento em que esta vivendo onde for possível: amigos, parentes, conversas, yoga, e muitos livros sobre a teoria e a história do casamento (soa parecido?).
Committed, é só isso: um livro em que a autora reflete sobre si mesma, seus relacionamentos, durante uma busca incansável por sentidos, numa linguagem simples, e por vezes, hilária! E justamente na sua sinceridade simples, sua linguagem coloquial, e fatos interessantes aprensentados de maneira informal, a gente sente que está re-encontrando uma velha amiga! Retomando a conversa desde a última vez que nos vimos, e dessa vez sobre uma nova etapa na nossa vida.
Eu aposto que assim como seu livro anterior, o sucesso de Committed vai acontecer por recomendações de mulheres que sabem que casamento não é tarefa fácil e que é preciso muito jogo de cintura, bom humor, e reflexão pra se seguir adiante. A escritora é honesta em todas as páginas, e em nenhum momento pinta um casamento cor-de-rosa, mas também não pinta o apocalipse.
Jovens que ainda não são casadas, talvez não se empolguem tanto com essa "sequencia", mas eu garanto que o livro é delicioso (e traz um certo alívio) pra qualquer mulher que se vê debatendo com as questões do casamento - casar ou não casar, eis a questão. Ficar casada, ou não? Eis outra questão.
Uma das críticas que eu li é que "Liz" tenta ser um pouco socióloga, um pouco antropóloga e acaba não sendo nada. Eu discordo. Em nenhum momento, ela se propõe em apresentar uma tese sobre a história ou as implicações sociais do casamento e quem escreveu isso pegou o bonde andando.
Os fatos que ela escolhe dividir com seus leitores são bastante inteligentes, e pertinentes, mas a verdade é que eu nunca vou ler uma tese de doutorado sobre as origens Cristãs do casamento. O que Gilbert faz, é digerir e dividir algumas informações sensíveis sobre a história do casamento como se estivéssmos sentadas pra um bate-papo no Frans Café em São Paulo.
Ela faz isso de tal forma que toda essa conversa escolarizada tem finalmente uma chance de talvez passar a fazer parte das conversas de seus leitores (mulheres de classe média entre 25 e 40 anos, casadas ou contemplantes do casamento e que tem outras coisas pra fazer além de estudar a origem do casamento).
Eu tenho certeza que eu não vou ser a única leitora a me identificar com a autora nessa sua nova empreitada. E aprecio a sua generosidade em querer dividir comigo a sua busca em entender pelo menos um pouco mais (o pouco que nos é necessário na vida do dia-a-dia) o quão complicada é a questão de casamento, e como estamos todas no mesmo barco.
Aliás, pra mim, essa é a melhor parte de Committed. A sensação de que eu não estou sozinha e que minhas angústias e dúvidas da vida casada são divididas com mulheres que nem conheço. Existe um alívio nisso tudo, uma possibilidade de identificação e de um entendimento do qual eu acho que ainda não falamos muito abertamente.
Se você é como eu, "ajuntada" ou casada, jovem, feminista, e não liga pra o que os críticos do New York Times tem a dizer, então é uma livro que eu recomendo!
Boa leitura!
Carol
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