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08/02/2010

Raiva, Cegueira e Vaidade

A semana passada foi uma loucura. Chegou o final da semana e eu estava só o pó. Vou fazer um breve resumo.

A semana começou assim: eu fui expulsa de um curso (a história é longa, chata, e sem relevância pra qualquer outra pessoa que não dê aula em Ontario), e depois fui re-aceita (a faculdade percebeu que o erro estava do lado deles). Vocês não imaginam o estresse, e a raiva que me deu da louca da professora que me expulsou. Mas (não sem a ajuda fundamental do meu marido) eu segurei as pontas, e consegui elaborar tudo muito bem de modo que eu fui quem resolvi as coisas de uma maneira civilizada. Fiquei muito orgulhosa de mim, por não ter deixado o sangue subir e dizer o que eu realmente estava sentindo (e queria dizer) pra tal da professora que quase transformou minha vida num inferno. Enfim. Deixei isso de lado, e tentei fazer as coisas de uma maneira em que o meu foco fosse eu - não ela. E ai sim, cuidei de mim e poupei minhas energias contra ela.

Depois, por outros motivos que aqui também não importam (a não ser se você dá aula em Ontario) eu escrevi pra um educador super famoso aqui no Canadá, sem expectativas de que ele sequer escrevesse de volta, e ele não só respondeu como lembrou exatamente de mim! (Eu o conheci quando organizei e assiti a sua palestra enquanto estava na faculdade aqui há uns 4 anos atrás). O fato é o seguinte: o Chris D'Sousa (esse professor super star) está intimamente ligado a todo o movimento de proteção e propagação da diversidade cultural nas escolas de Ontario - em sumo, a justiça social na escola. E foi ele quem abriu meus olhos pro fato de que aqui, eu vou ser sempre o outro, o imigrante, mas que isso não precisa ser necessariamente uma experiência negativa. Ao contrário, se a gente realmente se aceita e se permite ser, coisas incríveis acontecem. Foi ele um dos maiores responsáveis por elevar meu nível de confiança em mim mesma como professora, ao me lembrar que embora eu tenha um sotaque, eu tenho duas outras línguas, e que quando as famílias recém-chegadas da Colombia percebem que pelo menos eu sei estender a mão e falar "hola", elas não ligam pro meu sotaque e não me acham menos por isso. Foi esse homem (a quem eu escrevi pra agradecer mais uma vez, de coração pela sua luta interminável, e que essa semana finalmente culminou num documento oficial que todas as escolas daqui vão ter que adotar) que me mostrou que eu podia ser muito mais do que apenas mais uma professora, justamente porque eu sou diferente dos outros.

E finalmente, ja pelo fim da semana, eu tomei a decisão de não me preocupar mais com o fato do meu contrato só ir até abril, e abrir os olhos pras possibilidades que isso poderia me trazer também. Fiz um pacto comigo mesma de não me alarmar ao ficar desempregada (de novo) e aprender a me deixar levar. Existe uma dose de humildade nesse ato de fé na vida, que eu normalmente não tenho. Quem me conhece bem, sabe que essa é uma atitude radical pra mim... Geralmente eu me preocupo além da conta, e fico extremamente anciosa com situações das quais eu não tenho controle. Enfim, eu decidi tirar o melhor da situação, ja que a situação era essa (tudo isso porque no fim do mês de janeiro, a professora que eu substitui me escreveu dizendo que ela estava considerando voltar em abril). Enfim, fiz uma proposta pro meu diretor pra voluntariar na escola até eu conseguir outro contrato, de montar um grupo Multicultural uma vez por semana, contanto que ele me chamasse pra outra licensa maternidade assim que ele tivesse a oportunidade. Foi então que na sexta-feira, ele me chama no escritório dele e diz: "Carolina, então... preciso que você continue aqui até junho. A outra professora resolveu não voltar, e o emprego é seu até o fim do ano! Parabéns!"

Na sexta, quando eu finalmente administrei todo esse vai-e-vem, e esses altos e baixos, eu tive um sonho muito bizarro.

Sonhei que o Mike e eu estávamos nos casando de novo, e que minha madrinha Marilene iria pro casamento. Só que dessa vez, ela pediu pra trazer três filhos adotivos dela (que na vida real ela não tem; é só no sonho). Dois eram já rapazes, e a outra era uma moça. Todos os três eram bem problemáticos: um era cego e meio estranho, sombrio, medonho... O outro era muito irritadisso, completamente agressivo. E a moça era extremamente vaidosa, cheia de uma vaidade egoísta e controladora. Enfim... Durante o casamento, eu percebi que essas três figuras (que aliás eu nunca tinha visto na vida - não usei o rosto de ninguém conhecido no sonho) estavam no casamento pra matar a gente: sim, o Mike e eu! Estavam lá pra executar nosso assassinato! Imaginem... A impressão que eu tenho é de que o sonho durou a noite INTEIRA! Eu acordava com o susto de quase ser assassinada, ai voltava a dormir, e la vinha o sonho de novo, só que dessa vez, diferente. Em cada versão do sonho, eu fechava portas, mudava o cenário do casamento, tentava avisar seguranças (já pelo quinto sonho eu tinha gradualmente contratado seguranças, mudado o cenário e resolvido casar no Canadá, e tinha avisado a imigração de que esses loucos viriam atrás de mim e do meu marido) e nada dava certo. Essas três figuras pessonhentas estavam lá, me perseguindo.

Foi ai que pelo oitavo sonho (e tentativa mal sucedida de sono) eu cansei, pedi arrego, e rezei.

Agora... Eu rezo do meu jeito, sabe? Tipo, as vezes eu escrevo pra Deus... As vezes eu rezo mesmo, as orações que a gente aprendeu na escola. As vezes eu medito, e não penso em coisa nenhuma e apenas sinto a presença do mundo ao meu redor. As vezes eu dou bronca em Deus. E as vezes eu sonho que estou rezando, ou me comunicando diretamente com qualquer um que esteja disposto a me ouvir la do outro lado... Enfim, no sonho, eu lembro que eu virei pra Deus e disse:

"Deus: não estou entendendo... Vai, diz ai, o que é que eu preciso saber? Seja mais direto por favor, porque qualquer que seja a mensagem que você está tentando me mandar, eu óbviamente não estou compreendendo, e se você quiser que eu realmente entenda, vai ter que ser muito mais explícito, porque eu também preciso dormir e acordar cêdo pra ir trabalhar! Então por favor, me explica isso. Me diz o que é que eu não estou entendendo, quem são esses loucos, e como eu me livro deles..."

E foi ai, que no oitavo sonho, Deus finalmente respondeu:

"(Ele - Deus - me chamou de alguma coisa, mas não lembro se foi Filha, Carol, Carolina, Querida, enfim...) você não tem que se livrar deles. Não percebeu ainda que eles não te mataram? Que você continua fugindo deles, mas que continua viva? Eles representam a Raiva, a Cegueira e a Vaidade... E você conseguiu provar essa semana que se você quiser, você não se deixa mais afetar por esses males... Você conseguiu. Lidou bem com a professora apesar de no fundo, ter tido uma vontade intensa de retrucar o que ela fez, abriu teus olhos pro teu potencial humano, e humildimente aceitou seu destino, mesmo sem saber qual ele era. Agora vai adiante e continue lutando pra que esses males não mais te pertubem, e pra que eles não matem o que há de mais bonito e sincero em você. Pra que eles não mais te rodeiem."

Uau.

Foi surreal... Fiquei só com pena da minha dinda, porque não sei - não tenho a menor idéia pra ser sincera - por que raios foi justamente ela (no sonho) que trouxe esses "males" pra perto de mim.

Enfim, quando eu finalmente acordei, a primeira coisa que eu fiz foi contar o tal do sonho pro Mike! Eu estava super entusiasmada, achando que eu ja tinha visto a melhor parte e que eu tinha finalmente aprendido profundas lições de vida essa semana, e que essas revelações tinham sido feitas pra mim assim, de uma hora pra outra.

E foi ai que o meu marido querido (que me ajudou a manter a raiva não só nesse último episódio, mas em muitos outros, que sempre me encorajou a tudo que eu posso ser, e que sempre (sempre!) me deu perspectiva de que a vida é realmente tão grande que eu nunca vou poder controlá-la, mas que eu posso vivê-la da melhor maneira possível) enfim, foi ai que ele carinhosamente me disse:

"Babu, você não aprendeu tudo isso nessa última semana... Não se esqueça. Levou quase 30 anos..."

Então fica aqui o meu posting da semana... Pra todos aqueles que (quem quer que sejam) finalmente chegaram, ou passaram dos 30 de cabeça fria, com os olhos abertos, e sem vaidade.

Carol





2 comentários:

Ilzete disse...

Oi meu amor, já estava achando que voce não ia escrever nada este final de semana hehehe, mais uma vez ADOREI seu escrito apesar de não ter compartilhado sua angustia deste mês.
Em todos os seus escritos o que tenho notado tambem, é que cada vez mais voce e o Mikito estão muito bem Graças à Deus e a voces e eu tenho gostado muito.
Filha esses sonhos são incríveis, ainda bem que voce tem se dado a chance de entender e aprender como disse o Mikito, lindinho.
Beijos meu amor, fica com Deus, e mais uma vez Parabéns.

Lili disse...

Tears in my eyes...
PS: I started reading 'eat, pray, love'!